22.10.16

Michelangelo Antonioni, experiência direta com o poder da significação da imagem

Luigi Chiozzotto

Michelangelo Antonioni soube como nenhum outro Cineasta compreender e expressar com tamanha sensibilidade e pela linguagem cinematográfica, a dificuldade de comunicação entre os seres humanos no mundo de hoje, não obstante tantos dispositivos criados para estabelecer contato entre os seres. Por isso Antonioni é conhecido pelo epíteto de “cineasta da incomunicabilidade” e com distinta razão e atualidade. Embora no início de sua carreira Antonioni tenha perseguido os passos do neorrealismo, sobretudo em seus primeiros documentários, “Gente del Po” (1947), por exemplo; já em seu primeiro filme de ficção "Cronaca di un amore" - Crimes da Alma (1950), já se nota sua ruptura com os cânones do movimento percebendo-se seu efeito apenas no nível interior dos personagens, interpretados brilhantemente por Massimo Girotti e pela estreante, e a época ainda não Atriz, Lucia Bosè. Seus filmes posteriores invadem o espaço psicológico de sua geração, em especial aquele representado pela burguesia italiana. Com “Il Grido” – O Grito (1957); Michelangelo explora a questão do estranhamento do ser em meio a um mundo materialista, mesquinho, onde ele persegue os caminhos de um homem abandonado pela amada e que não encontra mais lugar no mundo sem ela. O filme embora rico em elementos inovadores do ponto de vista psicológico e de linguagem cinematográfica, deixa a desejar na construção do personagem “Aldo” (Steve Cochran), que por pertencer a um mundo proletário e consequentemente condicionado a cadeia de produção, mostra-se estranhamente rebelde ao abandonar sua vida segura para com sua filha pequena aventurar-se pelo país. Talvez tenha sido esse o motivo de o público não aceitá-lo, por não ter se identificado, e a crítica tê-lo rejeitado, fazendo com que Antonioni revesse sua trajetória cinematográfica para os anos seguintes. Uma experiência direta com o poder da significação da imagem aconteceu comigo quando retornava de carro com meus primos de Arezzo para a casa deles em Subbiamo, fazendo-me entender com significativa clareza a postura do enquadramento e a perseguição dos detalhes no trabalho de Michelangelo Antonioni. No caminho entre essas duas cidades existe uma capela com um afresco de Piero Della Francesca iluminado por uma luz difusa vinda do alto das janelas, sob um ambiente que inspira a contemplação. Antes daquela imagem ser pintada ali havia uma parede branca que fora inundada por cores e incorporada de linhas que se cruzam e que contam uma história. Os elementos pictóricos ali distribuídos de maneira a representar um momento da vida do homem viajaram no tempo nos emocionando sobremaneira mesmo após três séculos. Os humanos, por assim dizer, que estão representados na tela, nada falam, a imagem não emite som algum, no entanto, a impressão que se tem é de ouvir os ruídos daquele momento. Transferindo essa sensação para a tela branca do cinema, onde é projetada a imagem, em particular num filme de Michelangelo Antonioni, o que percebemos é algo semelhante; os elementos distribuídos em cena, objetos, personagens, iluminação, tudo faz com que o som, ou o simples pronunciamento de palavras seja mera convenção, um adorno para suportar a significação da imagem, uma espécie de moldura dourada em torno a um quadro. Para mim a cinematografia de Antonioni representa um estudo da evolução do olhar humano através dos meios de captação de imagem de nosso tempo, assim como Piero Della Francesca observou o seu mundo através de uma perspectiva representação tridimensional que possibilitava dar a ilusão da espessura e da profundidade, revolucionando a pintura moderna, Antonioni o faz no fotograma, e com uma abordagem poética, singular, emocionante, revolucionando ao seu modo o cinema mundial. Mas sua relação com a pintura não é exatamente aquela de Piero Della Francesca o qual citei como exemplo de comparativo para falar de um Cineasta que busca uma linguagem estética mais elevada, mas sim a citação de artistas plásticos contemporâneos. Nos filmes de Antonioni há por exemplo Filippo de Pisis, Giorgio De Chirico, Giorgio Morandi, Pollock, Rothko entre outros.

E-mail chiozzottoit@gmail.com

No comments: