14.8.17

Anos de ouro das universidades públicas brasileiras

Os prédios principais estavam relativamente prontos, a ansiedade pela mudança para o novo campus nos deixava muito apreensivos. Isso poderia acontecer a qualquer momento, as perspectivas giravam em torno de alguns dias. Tudo estava dependendo não apenas das condições dos prédios, pois todos estavam dispostos há sofrer um pouco mais, não obstante, menos do que já estávamos sofrendo, praticamente acampados em uma fábrica em Sorocaba. O problema estava sendo o de encontrar uma empresa de mudança com qualidade o suficiente para transportar a imensa quantidade de mobília, equipamentos frágeis de laboratório, caixas de documentos etc. Lembro-me que quase todo inicio de semana Carlos do RH vinha com a informação, logo pela manhã, que seria no dia seguinte. Ficávamos todos entusiasmados, no decurso do dia nada se concretizava e continuávamos entulhados mais uma semana em salas apertadas nas instalações de uma indústria química (NCH). A euforia era grande com a ideia de poder ocupar as salas definitivas nos novos prédios, que não eram muitos, apenas três prédios e meio. Projetávamos eufóricos como seria o nosso convívio num espaço amplo, em meio à natureza, com equipamentos modernos, salas amplas e bem luminosas. Estávamos na iminência de um sim, queríamos muito mas nem todos estávamos com tudo preparado, eu tinha apenas minhas impressões pessoais e minha recem comprada câmera fotográfica para levar nessa viagem, enquanto a hora da partida não chegava, passava colocando ela a prova nas mais difíceis condições de luz etc. Finalmente no dia três de março de 2008 partimos como em uma cruzada medieval numa comitiva de carros, vans e caminhões pela rodovia João Leme dos Santos, ainda uma estrada de duas mãos e muito perigosa, em direção ao novo campus. Para mim aquela experiência assemelhava-se a uma excursão com amigos, procurei me sentar ao lado do motorista na van, Elias, a fim de poder registrar as imagens daquela pequena viagem, pequena no percurso, mas grande no significado; uma nova vida esperava por todos. Essa experiência etnográfica e até certo ponto antropológica me possibilitou captar, por exemplo, o momento exato em que o primeiro móvel é descarregado do imenso caminhão baú que encostou com a traseira sobre a porta do prédio principal. Nesse que era uma espécie de armariozinho havia colado uma folha de papel escrito: “Isaias”. E assim improvisadamente, como quase toda a operação, aquela escrita informava o seu proprietário, o professor Isaias. Alguns anos depois o proprietário daquele armariozinho venceria a eleição para diretor do campus. Naquelas primeiras semanas do pós mudança o que mais se via entre os prédios eram docentes e técnicos adaptando as salas e os espaços que dividiriam com os colegas.  E a cada dia mais gente chegava, carregando caixas, computadores, plantas, livros, objetos pessoais, sobretudo, professores recem contratados em concursos, isso tudo em meio à operários que ainda faziam acertos e finalizações no espaço ocupado improvisadamente por nós. Os operários continuariam lá por mais alguns anos, e eu iria conversar muito com eles ainda, alias, eles seriam os protagonistas de um projeto de pesquisa dentro do campus que virou filme em 2009, pelo qual fui fui chamado, equivocadamente, pelo jornal Cruzeiro do Sul, de cineasta. Não que eu tenha algo contra cineastas, ao contrário, admiro-os muito, até falei da importância deles na construção do imaginário coletivo das cidades num livro meu publicado em 2007, mas estava longe de mim ser um cineasta, não por aquele filme.