Roberto Rossellini e Salvador Allende. |
Eu produzi muitíssimo cinema
militante naqueles anos. Porque enquanto continuava a desenvolver ao lado de
meu pai uma atividade profissional, paralelamente eu era politizado e me
apaixonava pelos movimentos de liberação, como aquele argelino. Sentia que podia
dar minha total adesão aos oprimidos daquela luta, para mim existia a escolha
própria de me colocar ao lado dos oprimidos, assim encontrei-me vivendo uma
experiência da qual acompanhei sua internacionalização: depois da Argélia, Cuba
e todo o movimento na America Latina, sucessivamente no Vietnam, o movimento de
liberação africano nas colônias portuguesas etc. Existia uma coligação entre
todos esses movimentos e aqueles que cresciam também na Europa, e eu me envolvi
como pude, com instrumentos que eram aqueles do cinema, também bastante
sofisticados, porque eu tinha despertado minha consciência, evoluído tecnicamente
ao lado de meu pai, Roberto Rossellini, portanto em uma escola humanista, e não unicamente política. Comecei a girar o mundo, a criar coligações
com pequenos grupos de produção cinematográfica. Com essa experiência e com
esse retro-terra comecei a trabalhar muito também na America Latina, na Argentina, no Brasil, no Chile. Me encontrei próximo a Allende durante a
primeira campanha eleitoral de 64, que ele perde, e essa experiência chilena eu segui
até os anos 70’, na segunda campanha eleitoral, que Allende vence. Forma-se
agora no Chile uma estrutura que se chamava “Chile no mundo” para dar
informações sobre o processo chileno e sensibilizar os setores intelectuais
através de uma campanha que se chamava “operação verdade”. Foram grandes
experiências, trágicas também. Tudo somado, filmes nós fizemos tantíssimos,
em todos esses países, e inevitavelmente eu tropecei em dificuldades de
compromisso político. Coloquei-me em posição defensiva, pois se acumulavam as
denúncias e iniciava a ter dificuldades na relação com a Instituição da Justiça,
que começara a criminalizar os valores em que eu acreditava, e eu fiquei muito
ressentido. Em 70-71 o Chile viveu um momento muito difícil porque a imprensa
internacional, fomentada dos Estados Unidos, dava uma imagem muito negativa da
situação e do processo político chileno. Allende disse que considerava
importante deixar uma entrevista em que lhe fosse dada a possibilidade de
exprimir os verdadeiros conteúdos de seu programa, para contrastar as
deformações de que era vítima, eu propus que ele deixasse uma entrevista
filmada ao papai, propriamente para tentar com a combinação do nome dos dois,
de chegar em muitas televisões. Papai era em Nova York, lhe telefonei e ele vem
ao Chile cheio de entusiasmo. Trabalhamos junto com Allende por três dias para
preparar a entrevista e depois gravamos. Depois, porem, ficou na gaveta até a
morte de Allende porque nenhuma televisão quis transmiti-la. É uma entrevista
estupenda, o encontro entre dois utopistas e um marxista utopista. É um
verdadeiro e próprio confronto de ideias sobre o mundo, que porém foi recusado
pelas televisões, também pela italiana, somente depois da morte de Allende. Os
anos 70 foram uma grande reviravolta de tudo porque houve uma grande mudança política,
o movimento do terceiro mundo foi profundamente poluído de uma ingerência de
tipo conspirativa, iniciou-se a falar muito de luta armada e, segundo minha
opinião, muito despropositado, e sobretudo no momento em que a União Soviética
tentava controlar esse movimento infiltrando os seus agentes. Foi então que da
minha parte comecei a dissociar-me dessa tendência de movimentos. Pessoalmente,
depois, vivi um trauma político e pessoal terrível quando em 73, no Chile,
aconteceu o golpe, quando centenas de pessoas com quem havia colaborado e havia
uma relação muito intima foram assassinadas em poucos dias e me encontrei
circundado de um panorama assustador de morte... Renzo Rossellini em Faldini; Fofi (1984)[1].
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